*Deputado Rasca
“Uma verdade inconveniente”, de Anderson Furlan, e “O animal responsável e a irresponsabilidade humana”, de Francisco Razzo – trazem à tona o debate sobre a guarda responsável dos equídeos e todos aqueles denominados “animais de companhia”. Para colaborar com mais reflexões sobre o tema, e para que fiquem claras as intenções na área nos últimos dez anos, é necessário, entretanto, esclarecer alguns fatos recentes.
Em janeiro de 2005, no primeiro mandato de Beto Richa como prefeito de Curitiba, passei a dirigir o antigo Departamento de Zoológico. O?órgão, integrante da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMMA), mantinha sob a sua responsabilidade o Zoológico de Curitiba, o Passeio Público e o Museu de História Natural do Capão da Imbuia. Naquela ocasião, o anseio da sociedade sobre a importância de o poder público tomar providências sobre o caótico cenário existente para os animais na cidade era evidente. Envolvia instituições, militantes da causa e cidadãos indignados com os maus-tratos, sensibilizados com a irresponsabilidade dos que abandonavam (e continuam abandonando) os animais cuja guarda mantinham.
Em reuniões articuladas com o Conselho Municipal de Proteção dos Animais, passamos a discutir o assunto com enfoque técnico e com o apoio de todos os que, de forma organizada, passaram a fazer contribuições para a elaboração do plano “Rede de Defesa e Proteção dos Animais da Cidade de Curitiba”. O texto, de maio de 2009, ainda está disponível, na íntegra, no site criado à época. Com isso, foi possível estabelecer um marco referencial importante na história da proteção dos animais na nossa cidade, pelo qual eu sou grato de ter participado e contribuído.
As ações propostas no texto se traduzem numa série de passos importantes, que deveriam ser dados ao longo do tempo, por governo e sociedade. Foi preciso reestruturar o Departamento de Zoológico, transformando-o em Departamento de Pesquisa e Conservação da Fauna, criando um ambiente mais bem organizado, com o estabelecimento de duas áreas voltadas à fauna, dotadas de atribuições descritas para dar segurança institucional às ações de proteção. Também foi estabelecida a carreira dos que, por concurso público, passaram a exercer a fiscalização do segmento. A partir disso, passou-se a estabelecer o arcabouço das leis que deixamos aprovadas e outras tantas que foram encaminhadas, como as que tratavam da proteção dos animais de circo, dos maus-tratos e do comércio de animais na cidade. Isso indica que não adianta apenas legislar, é preciso criar as condições para que as leis sejam cumpridas e fiscalizadas pelo poder público.
Tratando dos equídeos, evidenciava-se, à época, um verdadeiro mercado de exploração. Os animais eram submetidos aos maus-tratos e a trabalhos diários intensivos. Casos de crianças conduzindo os veículos de tração e atendimentos aos animais, que muitas vezes tinham de ser sacrificados pela sua má condição de saúde e exaustão, ocorriam com muita frequência. No entanto, o referencial que sempre impediu maiores avanços na definição da proibição do uso da tração animal sempre foi a questão social. Pensando nisso, o plano elaborado prevê, sim, ações voltadas ao problema. O Projeto Equino Metropolitano, por exemplo, consiste no resgate e encaminhamento dos animais para depositários interessados em recebê-los, principalmente estabelecendo uma parceria com os municípios da Região Metropolitana de Curitiba, onde existem chácaras e produção agrícola.
O Projeto Reciclar em duas rodas subentende intervenções em duas etapas: “O primeiro passo pode ser dado através de um estudo sobre a possibilidade de buscar argumentos legais para restringir o tráfego de animais de tração em vias pavimentadas, a exemplo do que já ocorre na cidade de São Paulo. O segundo passo consiste na substituição gradativa da tração animal na cidade, por motos e/ou pequenos triciclos, com rotas estabelecidas por sistemas de rodízio de cores na cidade. É necessária a organização cooperativa dos carroceiros atuais, com possibilidades de propaganda nos veículos por parte de empresas com interesse na responsabilidade social”, segundo o texto extraído do próprio plano.
De lá para cá existem, sim, avanços obtidos pelos curitibanos para a manutenção da qualidade de vida e o respeito aos animais. Contudo, o simples fato de termos um documento que estabelece e traduz o compromisso do poder público para com os animais não resolve o problema. Ainda há um longo percurso a ser percorrido e todos nós esperamos que aquele compromisso assumido não seja deixado de lado, pois há alternativa para a reconversão gradativa das atividades de tração animal na nossa cidade, com benefícios tanto para os animais quanto para os humanos.
*Rasca é deputado estadual pelo Partido Verde, no Estado do Paraná